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A cobrança abusiva de juros que pode livrar o seu veículo da busca e apreensão

Ninguém gosta de ficar sem pagar os seus compromissos. E não se tratando de um golpista, as pessoas também não fazem dívidas com o intuito de não pagá-las.

Porém, a vida é complexa e muitas coisas podem acontecer e tornar inviável o pagamento da dívida no prazo e na forma como foram estabelecidas, inicialmente.

Não pagar as dívidas no prazo acarreta em cobrança de juros, multa, correção monetária, encargos que são sabidos por todos e que têm essa função de penalizar o devedor pelo atraso.

Quando estamos falando de dívidas que envolvem o financiamento de um veículo, o atraso no pagamento das parcelas podem gerar um problema maior que somente a aplicação dos encargos moratórios, que é a busca e apreensão do veículo.

Não precisa de ter muitas parcelas em atraso para que isso ocorra. Normalmente, os bancos entram com a ação quando há, pelo menos, 3 (três) parcelas em atraso, mas basta uma para que isso seja possível.

E quando a apreensão de algum veículo é feita, surge o desespero.

Muitas pessoas estavam tentando negociar com o banco ou seus escritórios de cobrança/advocacia, até dispostos a pagar todas ou uma parte considerável das parcelas em atraso, quando são surpreendidos com a chegada do Oficial de Justiça em sua casa, trabalho, na rua, em qualquer dia ou horário, apreendendo o veículo e deixando um mandado de citação, dizendo que a pessoa pode recuperar o bem por meio do pagamento ou apresentar defesa no processo.

Essa situação é muito difícil e pode fazer com que você fique sem saber o que fazer.

E existem, na prática, por meio de diversas decisões judiciais, o reconhecimento de várias falhas que os bancos cometem no processo de busca e apreensão e em seus contratos que podem fazer com que o seu veículo seja devolvido.

Além da devolução do veículo, ainda pode ser possível revisar o seu contrato, na própria ação de busca e apreensão, para que haja a restituição/diminuição de valores pagos indevidamente.

Uma das principais possibilidades disso é quando há, no a cobrança de juros de forma abusiva.

E eu vou te explicar, nesse texto, sobre uma questão muito interessante sobre os juros cobrados pelo banco que tem esse poder de devolver o veículo, além de revisar o contrato, sem ter de fazer o pagamento total da dívida para reaver o bem.

Estamos falando sobre a capitalização diária dos juros.

A capitalização diária de juros em contratos de financiamento de veículos

Quando um banco faz um contrato de financiamento de veículo, ele pode escolher como ocorrerá a capitalização desses juros, que nada mais é que adicionar, ao valor inicial, mais juros.

Geralmente, em contratos bancários, vemos capitalização de juros em periodicidade anual, mensal ou diária. E todas essas modalidades de cobrança de juros são permitidas pela lei.

Então não há o que ser feito, já que essa cobrança de juros é possível? Não é bem assim!

Embora seja possível, deve haver uma informação clara sobre essa questão da capitalização e é muito comum os bancos descumprirem a orientação judicial sobre essa informação, escondendo a capitalização diária em cláusulas contratuais.

E esse fato de ocultar a informação, faz com que essa forma de cobrança seja considerada como ilegal pela justiça.

A ausência de informação clara e adequada sobre a capitalização diária de juros em contratos de financiamento de veículos

Para que seja possível a cobrança da capitalização diária de juros em contratos de financiamento de veículos, é necessário que os bancos informem, através de cláusulas contratuais a existência dessa cobrança, além de informarem o percentual dessa cobrança.

Isso tem de ficar claro no contrato, caso contrário, é ilegal!

Os bancos tem de apresentar as taxas diárias, mensais e anuais da operação, por exemplo, dessa forma: Taxa de juros diária de 0,33%, taxa de juros mensal de 1,2%, taxa de juros anual de 12,85%.

Essa é a forma adequada de fazer a informação da capitalização diária de juros, todavia, os bancos costumam apenas informar as taxas mensais e anuais, embutindo em qualquer outra parte a informação de que haverá a cobrança da capitalização diária, sem informar qual é essa taxa, igual nessa imagem abaixo:

Desse contrato, é possível observar que somente consta a informação da capitalização diária, contudo, sem a especificação de qual é a taxa de juros desse período, havendo somente as informações quanto a taxa mensal (1,95%) e a anual (26,15%).

Quando ocorre essa situação, haverá a ilegalidade da cobrança da capitalização diária de juros, que poderá resultar na restituição do veículo, além de revisão dos valores cobrados, conforme entendimento da justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO CONSUMIDOR/RÉU. MÉRITO. ALEGADA A ABUSIVIDADE DA CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA DE JUROS. ACOLHIMENTO. INEXISTÊNCIA DE INDICAÇÃO PRECISA E EXPRESSA DA TAXA DE JUROS DIÁRIA NO CONTRATO. VEDAÇÃO DA INCIDÊNCIA NA MODALIDADE. PRECEDENTES. ABUSIVIDADE QUE DESCARACTERIZA A MORA. TEMA 28 DO STJ. DESCARACTERIZAÇÃO QUE SE IMPÕE, COM A CONSEQUENTE EXTINÇÃO DA AÇÃO POSSESSÓRIA. REVERSÃO DA BUSCA E APREENSÃO, DEVENDO A PARTE AUTORA RESTITUIR O BEM APREENDIDO E, NA IMPOSSIBILIDADE, INDENIZAR A PARTE RÉ COM BASE NO VALOR DE MERCADO DO BEM, TENDO COMO REFERENCIAL A TABELA FIPE DA DATA DA APREENSÃO, ACRESCIDO DE MULTA DE 50% SOBRE O VALOR ORIGINALMENTE FINANCIADO. PRECEDENTES. SENTENÇA REFORMADA. ÔNUS SUCUMBENCIAIS REDISTRIBUÍDOS. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

(TJSC, Apelação n. 5088098-50.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Stephan K. Radloff, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 17-12-2024).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO E RECONVENÇÃO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS NA PERIODICIDADE DIÁRIA. DEFENDIDA LEGALIDADE. INSUBSISTÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO DESACOMPANHADA DE EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL DA TAXA DIÁRIA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. VIOLAÇÃO AO DIREITO DE INFORMAÇÃO DO CONSUMIDOR (ART. 6º, III, CDC). ILEGALIDADE CONTRATUAL. PRECEDENTES.

ÔNUS SUCUMBENCIAIS. DEFENDIDA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. INVIABILIDADE. HIPÓTESE EM QUE HOUVE O JULGAMENTO DO MÉRITO E SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. PRECEDENTES DESTA CORTE. MANUTENÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO OPERADA NA ORIGEM.

HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS, EIS QUE PREENCHIDOS OS REQUISITOS CUMULATIVOS DEFINIDOS PELO STJ (TEMA 1059).

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

(TJSC, Apelação n. 5037363-13.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 19-12-2024).

DIREITO COMERCIAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO E PEDIDO RECONVENCIONAL. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE RÉ/RECONVINTE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1. Trata-se de apelação cível interposta em face de sentença proferida que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial da ação de busca e apreensão e parcialmente procedente o pedido reconvencional.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2. Se cabe a descaracterização da mora frente ao afastamento da capitalização diária; se os juros remuneratórios praticados no contrato são abusivos; se em caso de acolhimento dos pedidos anteriores, teria cabimento a fixação de multa prevista no art. 3º, §6º do Dec-Lei n. 911/1969, bem como em caso do bem ter sido alienado, se o valor deve ser restituído ao apelante com base na tabela FIPE. Por fim, se a tarifa de registro deve ser afastada, ante a onerosidade excessiva, bem como se cabe a inversão do ônus da sucumbência.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3. Necessária reforma da sentença quanto à procedência da busca e apreensão, tendo em vista que afastada a capitalização diária, bem como, neste grau de jurisdição, reconhecida a abusividade dos juros remuneratórios. Necessária observância do Tema 28 do Superior Tribunal de Justiça, o qual determina a descaracterização da mora.

4. Retorno das partes ao status quo ante, a indenização deve-se dar a partir do preço médio do veículo ao tempo da apreensão devidamente atualizado (FIPE).

5. Possibilidade de aplicação da multa prevista no art. 3º, §6º do Dec-Lei 911/1969. Sentença de improcedência da ação de busca e apreensão. Pagamento equivalente a cinqüenta por cento do valor originalmente financiado, devidamente atualizado, caso o bem já tenha sido alienado.

6. Tarifa de Registro. Comprovação pela casa bancária de realização do registro, bem como valor constante do contrato que não se mostra abusivo. Obediência ao previsto no Tema 958 da Corte da Cidadania.

7. Honorários de sucumbência e custas processuais. Aplicabilidade do parágrafo único do art. 86, CPC. Inversão do ônus sucumbencial e do pagamento das custas, devendo ser arcado integralmente pela instituição bancária.

8. Inviável a majoração dos honorários com base no art. 85, §11, do CPC.

IV. DISPOSITIVO E TESE

9. Recurso conhecido e parcialmente provido.

Dispositivos relevantes citados: art. 6º, III, do CDC; art. 3º, §6º, do Decreto-lei 911/69; Art. 1.361 do CC.

Jurisprudência relevante citada: .ecurso Especial n. 1.061.530/RS (Tema 28); TJSC, Apelação n. 5017560-78.2022.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Osmar Mohr, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 29-02-2024; Recursos Especial n. 1.578.553/SP (Tema 958).

(TJSC, Apelação n. 5050934-51.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Newton Varella Junior, Sexta Câmara de Direito Comercial, j. 06-02-2025).

O que acontecerá com a ação de busca e apreensão de veículo quando a justiça reconhece cobrança abusiva de juros?

Havendo o reconhecimento da abusividade da cobrança de juros capitalizados diariamente, a solução será a:

  • Improcedência da ação de busca e apreensão, isso significa que o processo que o banco entrou, de busca e apreensão, será julgado desfavoravelmente a ele;
  • Revisão do contrato, a retirada da capitalização diária de juros significará diminuição dos valores pagos e até com a possibilidade de restituição do que foi pago a maior de forma dobrada;
  • Condenação do banco ao pagamento dos custos do processo, os valores referentes às custas judiciais e honorários de sucumbência deverão ser pagos pelo banco;
  • Devolução imediata do veículo, essa devolução não é condicionada ao pagamento de nenhum valor a mais ao banco, devendo ser feita, geralmente, em até 5 (cinco) dias;
  • Condenação do banco a pagar multa de 50% (cinquenta por cento) do valor originalmente financiado caso tenha vendido o veículo, isso porque pode ter ocorrido, durante o processo, que o banco tenha vendido o veículo em um leilão, nesse caso, com a improcedência da ação de busca e apreensão, o banco terá de pagar esse valor a título de multa;
  • Indenização do valor do veículo pela FIPE da data da apreensão, caso o veículo tenha sido vendido;
  • Indenizações por danos morais, materiais e lucros cessantes, podendo ser cobrado do banco, na própria ação de busca e apreensão, todos os prejuízos que a pessoa/empresa teve com a ação que foi revertida.

Porque que todas essas coisas podem acontecer pelo simples fato de haver essa cobrança abusiva de juros?

Isso acontece porque a justiça considera que a cobrança abusiva praticada pelo banco, no período de normalidade contratual, ou seja, no período que a pessoa ainda não estava na situação de inadimplência, faz com que o devedor não tenha culpa pelo atraso (descaracterização da mora), tornando o credor o culpado por isso.

Esse é o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça:

ORIENTAÇÃO 2 – CONFIGURAÇÃO DA MORA

a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora;

b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual.

Cuidado com a ação de busca e apreensão!

É importante, porém, não se descuidar da ação de busca e apreensão, tomando as providências necessárias e buscando auxílio jurídico especializado no tema.

O processo é rápido, tudo acontece em pouco prazo e se defender de forma adequada é a melhor solução.

A justiça não faz essa análise da questão de juros e quaisquer outras ilegalidades cometidas no processo de busca e apreensão ou no contrato de financiamento sem que o interessado faça a alegação, da forma correta, pelo meio correto e no prazo adequado.

Deixar passar os prazos para se defender ou apresentar defesa frágil, que não aborda o que precisa ser tratado e se perde em alegações genéricas, é facilitar a vida do banco e sofrer um imenso prejuízo com um processo que poderia ter um final positivo para você.

Por isso, contrate um advogado especialista nesse assunto para te ajudar, caso esteja passando por esse problema.

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